São Luís-Maria Grignion de Montfort
(1673–1716)
Canonizado pelo Pp. Pio XII em 1947
O Tratado da Verdadeira Devoção
à
Santíssima Virgem
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Para esta brevíssima apresentação de
São Luís Maria, acudo às palavras de São João Paulo II, a 21 de Junho de 1997,
na sua carta dirigida à Família Monfortina, por ocasião do 50º aniversario da
canonização de São Luís-María Grignion de Montfort.
O Santo Padre anuncia a sua felicidade
na acção de graças ao Senhor «pela grande irradiação deste
santo missionário, cujo apostolado foi nutrido por uma profunda vida de oração,
uma inabalável fé em Deus Trindade e uma intensa devoção à Santíssima Virgem
Maria, Mãe do Redentor.» E
continua: «Pobre entre os pobres, profundamente integrado na
Igreja apesar das incompreensões que encontrou, São Luís-Maria tomou por lema
estas simples palavras: “Só Deus”. Ele cantava: “Só Deus é a minha ternura, só
Deus é o meu sustentáculo, só Deus é todo o meu bem, a minha vida e a minha
riqueza” (Cântico 55,
11). Nele, o amor por Deus era total. Era com Deus e por Deus que ia ao
encontro dos outros e percorria os caminhos da missão.»
O Papa louva
também a espiritualidade teocêntrica de São Luís-Maria, quem tinha o “gosto de Deus
e da Sua Verdade” (O amor da Sabedoria
eterna, n.13), e não hesitava «em abrir aos mais humildes o mistério da
Trindade, que inspira a sua oração e a sua reflexão sobre a Encarnação
redentora, obra das Pessoas divinas». «A pessoa de Cristo domina o
pensamento de Grignion de Montfort: “Jesus Cristo, nosso Salvador, verdadeiro
Deus e verdadeiro homem, deve ser o fim último de todas as nossas outras
devoções” (Tratado da verdadeira devoção,
n. 61). A Encarnação do Verbo é para ele realidade absolutamente central: “Ó
Sabedoria eterna [...] adoro-Vos [...] no seio do vosso Pai durante a
eternidade, e no seio virginal de Maria, vossa digna Mãe, no tempo da vossa
Encarnação” (O amor da Sabedoria eterna,
n. 223).»
Noutra
ocasião, num escrito autobiográfico, com ocasião do 50º aniversario da sua
ordenação sacerdotal, João Paulo II não hesita em afirmar que São Luís-Maria «é um teólogo de classe». De
facto, pôs ao serviço da sua pluma todos os conhecimentos sólidos que tinha da
Teologia dogmática y patrística juntamente com os ardores de um coração amante
de Maria e Jesus.
São João
Paulo II a respeito do “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”
O Papa, na
sua carta com motivo do 50º aniversario da canonização de São Luís-Maria, diz-nos
que «para conhecer a Sabedoria eterna, incriada e encarnada, Grignion de
Montfort convidou constantemente a confiar na Santíssima Virgem Maria, tão
inseparável de Jesus que «antes se separaria a luz do sol» (Verdadeira devoção, n. 63)»,
e ressalta a chamada do santo monfortino a «consagrar-se totalmente a Maria,
para acolher a sua presença no mais íntimo da alma».
Foi
exactamente isto que fez São João Paulo II, quem teve como livro de cabeceira e
livro de bolso que o acompanhou toda a sua vida, o Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, de São
Luís-Maria Grignion de Montfort. Foi do mesmo Tratado donde João Paulo II retirou o seu lema episcopal tal como o
atesta na sua Carta Apostólica Rosarium
Virginis Mariae, 15: «Esta acção
de Maria, totalmente fundada sobre a de Cristo e radicalmente subordinada a
esta, «não impede minimamente a união imediata dos crentes com Cristo, antes a
facilita»[1].
É o princípio luminoso expresso pelo Concílio Vaticano II, que provei com
tanta força na minha vida, colocando-o na base do meu lema episcopal: Totus tuus.[2]
Um lema, como é sabido, inspirado na doutrina de S.Luís Maria Grignion de
Montfort, que assim explica o papel de Maria no processo de configuração a
Cristo de cada um de nós: “Toda a nossa
perfeição consiste em sermos configurados, unidos e consagrados a Jesus Cristo. Portanto,
a mais perfeita de todas as devoções é incontestavelmente aquela que nos
configura, une e consagra mais perfeitamente a Jesus Cristo. Ora, sendo Maria
entre todas as criaturas a mais configurada a Jesus Cristo, daí se conclui que
de todas as devoções, a que melhor consagra e configura uma alma a Nosso Senhor
é a devoção a Maria, sua santa Mãe; e quanto mais uma alma for consagrada a
Maria, tanto mais será a Jesus Cristo”.[3]»
São
Luís-Maria, o “Tratado” e Satanás
São Luís escreveu o Tratado,
provavelmente, no ano 1712, tendo o santo morrido a 28 de Abril de 1716. Os
escritos de Luís-Maria foram cuidadosamente guardados —quiçá num arquivo ou lugar reservado—, até que os tempos
revolucionários do século XVIII francês obrigaram a mãos piedosas a fechá-los
num cofre e a sepultá-los debaixo de terra à espera de tempos de ressurreição.
Este momento chegou em 1842 —passados 130 anos—, e, como uma verdadeira graça
sobrenatural, o livro do Tratado apareceu ao mundo em 1843.
Este acontecimento foi previsto à letra (revelação?,
profecia?) pelo autor. Assim escreve São Luís no nº 114 do Tratado: «Prevejo
que muitas bestas enraivecidas virão em fúria para rasgar com seus dentes diabólicos
este pequeno escrito e aquele de quem o Espírito Santo se serviu para o compor.
Ou pelo menos procurarão envolver este livrinho nas trevas e no silêncio duma
arca, a fim de que não apareça. Atacarão mesmo e perseguirão aqueles que o
lerem e puserem em prática. Mas, que importa? Tanto melhor! Esta visão
anima-me e faz-me esperar um grande êxito, isto é, um grande esquadrão de
bravos e valorosos soldados de Jesus e Maria, de ambos os sexos, que combaterão
o mundo, o demónio e a natureza corrompida, nos tempos perigosos que mais do
que nunca se aproximam! (cf. Mt 24, 15). “Aquele que lê, entenda! Quem puder
compreender, compreenda!” (Mt 19, 12).»
O “Tratado da Verdadeira Devoção
à Santíssima Virgem”
Continuo a
citar a carta de São João Paulo II com ocasião do 50º aniversario da canonização
de São Luís Maria: «No nosso tempo, em que a devoção mariana é viva mas nem
sempre suficientemente esclarecida, seria bom reencontrar o fervor e o justo
estilo do Padre de Montfort, para atribuir à Virgem o seu verdadeiro lugar
e aprender a orar: «Ó Mãe de misericórdia, dai-me a graça de obter a verdadeira
sabedoria de Deus e de me colocar por isso no número daqueles que amais,
ensinais e conduzis [...] Ó Virgem fiel, tornai-me em todas as coisas um
perfeito discípulo, imitador e escravo da Sabedoria encarnada, Jesus Cristo,
vosso Filho» (O amor da Sabedoria eterna, n. 227)».
Nesta publicação, e em publicações posteriores, farei uma colectânea dos
números do Tratado, que quero ressaltar, de acordo com aquilo que é a temática
do Apelos de Nossa Senhora.
Introdução do “Tratado da Verdadeira Devoção”
1.
Foi pela Santíssima Virgem Maria que Jesus Cristo veio ao mundo, e é também por
Ela que deve reinar no mundo.
5. Maria é a obra-prima por excelência do Altíssimo, cuja
posse e conhecimento Ele reservou para si. Maria é a Mãe admirável do Filho o
qual quis humilhá-la e escondê-la durante a vida para favorecer a sua
humildade. Para este fim tratava-a pelo nome de “Mulher” (Jo 2, 4; 19, 26), como a uma estranha, embora no seu Coração a estimasse
mais do que a todos os anjos e a todos os homens.
Maria é a fonte selada[4] e a esposa do
Espírito Santo, onde só Ele tem entrada. Maria é o Santuário e o Repouso da Santíssima Trindade, onde Deus está mais magnífica e divinamente que em
qualquer outro lugar do universo, sem exceptuar a sua morada acima dos querubins
e serafins. Neste santuário nenhuma criatura, por mais pura que seja, pode
entrar, a não ser por grande privilégio.
6. Digo com os santos: a divina Maria é o Paraíso Terrestre
do novo Adão,[5] onde Ele encarnou
por obra do Espírito Santo, para aí operar maravilhas incompreensíveis. É o
grande, o divino mundo de Deus, onde há belezas e tesouros inefáveis. É a
magnificência do Altíssimo, onde Ele escondeu, como em seu Seio, o seu Filho
Único e n'Ele tudo o que há de mais excelente e precioso. Que grandes e misteriosas
coisas fez o Deus omnipotente nesta admirável criatura, segundo Ela própria é
forçada a dizer, a pesar da sua profunda humildade: “O poderoso fez em mim grandes coisas!” [Lc 1, 49]. O mundo não conhece estas maravilhas,
porque é incapaz e indigno disso.
8. Todos os dias, de um extremo a outro da Terra, no mais
alto dos céus, no mais profundo dos abismos, tudo proclama e publica a
admirável Virgem Maria. Os nove coros dos anjos, os homens de ambos os sexos,
idades, condições ou religiões, os bons e os maus, e até os mesmos demónios são
forçados a chamá-la bem-aventurada, quer queiram, quer não; a isso os obriga a
força da verdade. Como diz São Boaventura, todos os anjos lhe cantam no Céu
incessantemente: “Santa, Santa, Santa
Maria, Mãe de Deus e Virgem!”[6]
E, todos os dias, lhe oferecem milhões de vezes a saudação angélica: “Ave, Maria...”, prostrando-se na sua presença e pedindo-lhe a mercê de
os honrar com algumas das suas ordens. O próprio São Miguel –disse Santo
Agostinho–, embora seja o príncipe de toda a corte celeste, é o mais diligente
em lhe prestar toda espécie de homenagens e em fazer com que lhas tributem.
Constantemente aguarda a honra de por Ela ser mandado em auxílio a alguns dos
Seus servos.
10. Depois disto,
forçoso é dizer com os santos: “De
Maria numquam satis!”[7]
Isto é, Maria não foi ainda suficientemente louvada e exaltada, honrada, amada
e servida. Merece ainda muito maior louvor, respeito, amor e serviço.
12. Depois de tudo isto, temos de exclamar com o Apóstolo: “Nem os olhos viram, nem os ouvidos ouviram, nem
o coração do homem compreendeu...” [1 Cor 2, 9] as belezas, as grandezas e a
excelência de Maria, o mais sublime milagre da graça, da natureza e da glória.
Se quereis compreender a Mãe, diz um santo, procurai compreender o Filho. Ela é
uma digna Mãe de Deus: “Que
toda a língua aqui emudeça!”
13. Foi o meu coração
que ditou o que acabo de escrever com particular alegria, a fim de mostrar como
Maria Santíssima tem sido insuficientemente conhecida até agora e como é esta
uma das razões por que Jesus Cristo não é conhecido como deve ser.
Se é certo que o
conhecimento e o Reino de Jesus Cristo se estabelecerão no mundo, não será mais
que uma consequência necessária do conhecimento e do Reino da Santíssima Virgem
Maria. Ela deu Jesus Cristo ao mundo a primeira vez, e há de fazê-lo
resplandecer também segunda vez.
Sobre este nº13 cito as palavras do Pp. Paulo VI, no Discurso na Clausura
da Terceira Sessão do Concilio Ecuménico Vaticano II, (21.11.1964): «O
conhecimento da verdadeira doutrina católica sobre Maria constituirá sempre uma
chave para a exacta compreensão do mistério de Cristo e da Igreja»
Testemunhos de Papas e autoridades eclesiásticas sobre o “Tratado da
Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”, de São Luís-Maria Grignion de Montfort
São Pio X — «Recomendamos
empenhadamente o admirável Tratado de
Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem do Bem-aventurado Montfort, e a
todos aqueles que o lerem concedemos jubilosamente a Bênção Apostólica»
Bento XV — «[São Luís] deixou-vos
este livro escrito pela sua própria mão [...] de tão grande autoridade e de tão
grande unção»
Pio XII — «[São Luís]
conseguiu que a integridade da doutrina católica fosse salvaguardada e que a
religião católica iluminasse não apenas os espíritos, mas que viesse a exercer
uma influencia benfazeja sobre os costumes privados e públicos»
O Cardeal D. José Saraiva
Martins, Perfeito para a Congregação para as Causas dos Santos (1998-2008), no
seu prefacio à edição portuguesa (Março 2012), refere-se ao Tratado como «uma espécie de tratado
doutrinal sobre algumas verdades centrais da nossa fé».
Recentemente a Congregação para o Culto Divino, com o
motivo da decisão de inscrever a celebração do Santo de Montfort no Calendário
Romano Geral, diz o seguinte: «Recolhendo no ensinamento mariano de São Luís
Maria Grignion de Montfort, como de saudável fonte, as indicações para a vida
espiritual, são formadas, nos seminários e nos noviciados de todo o mundo, gerações
de sacerdotes, de homens e mulheres consagrados a Deus, e ainda de
numerosíssimos fieis. Não poucos santos e bem-aventurados encontraram na
espiritualidade monfortana a fonte na qual podem alimentar sua Devoção à Mãe de
Cristo e da Igreja. Ainda hoje diversos movimentos e grupos, espalhados pelas
diversas partes do mundo, fazem explícita referencia à doutrina de São Luís
Maria Grignion de Montfort.»
[1] Conc. Ecum. Vat. II, Const. Dogm. Lumen Gentium, 53
[2] Cf. Primeira Rádiomensagem Urbi et orbi (17 de Outubro de 1978): AAS 70 (1978)
[3] Tratado da verdadeira
devoção a Maria, 120, em: Obras. Vol. I Escritos espirituais (Roma 1990), p. 430.
[4] «És jardim fechado, minha irmã, minha esposa, nascente
fechada, fonte selada» (Cant 4, 12).
[5] Esta leitura de Gen
2, 8 em sentido mariano encontra-se também, por exemplo, em S. Efrém, S.
Proclo, S. Ambrósio, S. João Damasceno, S. Leão Magno.
[7] Cf. Boudon, A Imaculada, prefácio, vol. 2, col. 589: «Se
se disser que há demasiados livros sobre a devoção à Santíssima Virgem, os
Santos Padres respondem que nunca se poderá louvá-la suficientemente; e São
Bernardo, em especial, assegura que, ainda que todos os homens se esforçassem
por falar dela, nunca se poderia dizer o bastante...»
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